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O que é desinformação? E como ela pode ser vista de várias formas
01.06.2023 - 19h54
Rio de Janeiro - RJ
por Henrique Fontes, em parceria com Humaitá Digital
Não há dúvidas que a desinformação é um fenômeno cada dia mais recorrente no dia a dia em qualquer canal de comunicação que se use. Nos últimos anos, ela se transformou em estratégia política e de conquista do poder, moldando eleições nos mais diversos países – como a campanha presidencial de Jair Bolsonaro, em 2018, a campanha de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos, em 2016 e, mais recentemente, a reeleição de Tayyip Erdogan, no último domingo (28), presidente da Turquia há 20 anos – e afetando (até destruindo) a convivência entre as pessoas. No entanto, o que faz a desinformação ser, muitas vezes, mais disseminada que a verdade?
Termos
Antes de explicarmos o que leva a mentira a ser tão bem sucedida, vamos nos entender com as nomenclaturas. Todos já escutaram o termo “fake news” alguma vez na vida. Em tradução literal, a expressão significa “notícia falsa”. Esse vocábulo, no entanto, gera um debate: como pode ser notícia se ela é falsa?
Por isso, é sempre mais correto nos referir a essas inverdades como desinformação, um termo que faz mais jus a esse fenômeno do que a ambiguidade de uma “notícia” falsa ou mesmo de uma mentira, que implica certa intencionalidade de quem a produz.
O histórico 
A mentira sempre fez parte do mundo político, muito antes da invenção da internet e da febre das redes sociais. O International Center For Journalists (“Centro Internacional para Jornalistas”), criou  “A short guide to the history of ’fake news’ and disinformation” (“Um guia curto sobre a história das ‘fake news’ e desinformação”, em tradução livre), uma linha do tempo que cita algumas das mais notáveis informações fabricadas na história, datadas de 44 a.C. a 2018.
O que mudou da época medieval para hoje em dia foi a forma e os meios em que a mentira é propagada. Antigamente, o compartilhamento da desinformação era um processo invariavelmente local e oral. A mentira era contada no boca a boca e se espalhava muito lentamente. Mas a criação da prensa de Gutenberg, em 1493, mudou drasticamente a velocidade em que as mentiras se espalhavam, acelerando-a. Foi a partir dela que aconteceu a primeira grande farsa na imprensa, a chamada “The Great Moon Hoax”, traduzida livremente para “A grande farsa da Lua”. Tratava-se de uma série de seis artigos publicada pelo New York Sun, afirmando que existia de fato vida na Lua, com imagens de morcegos humanóides e unicórnios de barba.
Litografia publicada pelo New York Sun da suposta vida na Lua.
Desde então, a velocidade de propagação de desinformação só fez crescer. Em seu artigo “Morte e vida da Imprensa”, Carlos Eduardo Lins comenta sobre a evolução da mentira no mundo. Para ele, a velocidade, a simplicidade e o baixo custo para produzir e disseminar falsidades com capacidade de proliferação muito rápida e abrangência geográfica imensa são alguns dos pontos cruciais da fácil propagação.
“O ‘não-fato’ é agora divulgado sem nenhum tipo de constrangimento até por pessoas que ocupam altos postos na hierarquia de poder, a começar por chefes de governo e de Estado”, diz Lins. De acordo com o pesquisador, não é que os líderes no passado não mentissem. Muito pelo contrário. Lins afirma que provavelmente todo líder político sempre mentiu, quase que por definição. “Faz parte da política mentir, ocultar fatos, exagerar. A política sempre foi assim e sempre será. É impossível fazer política sendo absolutamente fiel aos fatos. A diferença é que antes isso se fazia dissimuladamente e quem mentia negava mentir. Agora, é despudorado”, argumenta o pesquisador.
Os diferentes tipos de desinformação
Não existe apenas um tipo de desinformação. Na verdade, são três tipos: misinformation, malinformation e disinformation. Cada uma dessas versões é parte de uma linha do tempo da informação errada, ou seja, da trajetória que ela faz desde a percepção de quem a  propaga até a intenção do sujeito por trás da disseminação.
A misinformation acontece quando o fato narrado contém erros não intencionais manifestados em legendas de fotos, datas, estatísticas, traduções impróprias ou em sátiras, quando levadas a sério enquanto conteúdo informativo-noticioso. Conhecida também como falsa conexão, esse fenômeno é ilustrado em páginas satíricas, como O Sensacionalista, ou em erros de tradução. Também ocorre por ignorância do receptor a respeito da mídia usada, ou seja, quando não há capacidade para entender que o fato relatado não faz sentido porque o receptor não possui elementos para identificar o erro. Um exemplo: quando um artigo de opinião é confundido com uma reportagem investigativa.
Por outro lado, a malinformation é dotada de uma conotação muito mais negativa. Ela consiste numa publicação deliberada de informações privadas para fins pessoais ou corporativos em vez de interesse público – como pornografia de vingança – ou uma mudança deliberada de contexto, data ou hora do conteúdo genuíno. Esse tipo de fabricação de informações já não é mais um erro inocente, como pode acontecer com a misinformation, mas sim algo pensado e planejado para desinformar ativamente.
Já a disinformation é o que podemos classificar como a “etapa final” da mentira. Ela é composta de conteúdos fabricados e deliberadamente manipulados, que podem ir desde audiovisuais até teorias da conspiração e que têm como único objetivo enganar e prejudicar pessoas. Teorias como a dos reptilianos, segundo a qual todos os líderes mundiais seriam de uma raça alienígena de répteis que almejam poder e podem se disfarçar de humanos perfeitamente, ou a que a Terra seria, na verdade, plana, fazem parte dessa definição.

Esses três tipos de mentira são parte de um grande ecossistema de desinformação, desde as acidentais e não intencionais até as mais perversas. Esse ambiente envolve:
Por que a desinformação continua?
Existem diferentes motivos para isso, mas que trabalham em conjunto para que o mecanismo da desinformação nunca pare de funcionar.
A primeira engrenagem da indústria da desinformação é o que chamamos de viés de confirmação, que já destrinchamos uma vez aqui na Intervalo. Resumidamente, esse fenômeno é o consumo ou interpretação de informações a partir do que já temos como verdade. Isso significa que o viés é como uma peneira, que filtra as informações que batem com nossas crenças e descarta aquelas que vão de encontro a elas, sejam essas afirmações verdadeiras ou não.
O segundo aspecto desse maquinário de desinformação é a pós-verdade. Eleita palavra do ano em 2016 pelo Dicionário Oxford, sua definição contempla as “circunstâncias nas quais fatos objetivos têm menos influência para definir a opinião pública do que o apelo à emoção ou crenças pessoais”.
Com essas duas engrenagens, a indústria da desinformação opera a todo vapor, com a difusão sistemática de mentiras por grupos - de apoiadores ou bots - que desejam suprimir a informação, impedindo que outros grupos ajam contra eles. Ataques coordenados, estratégicos e planejados para esconder a verdade, confundir o público e criar controvérsia onde nenhuma antes existia são algumas estratégias para a disseminação das mentiras. 
Além disso, outras ferramentas envolvem a) o alto volume de conteúdo em canais diversificados, fazendo com que as pessoas passem a dar credibilidade ao receberem a informação de diversas fontes, num processo rápido e contínuo; b) a antecipação na desinformação. Quanto mais cedo a mentira for revelada como “novidade”, melhor, para que assim se siga o bombardeio de desinformações e as pessoas tenham a impressão de que já ouviram aquilo há muito tempo c) a falta de consistência entre discursos, que, mesmo desmentidos, servem para gerar confusão; d)  e a tão conhecida cortina de fumaça, o ato de plantar uma mentira para desviar a atenção de um fato importante e grave.
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