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Direto da Macedônia: ‘Ganhei dinheiro publicando notícias falsas’
22.09.2017 - 17h00
Rio de Janeiro - RJ
Na redação de uma pequena rádio de Veles, no interior da Macedônia, um jovem de 19 anos olha para a câmera e dispara, em inglês: “É claro que eu ganhei dinheiro publicando notícias falsas, mas o Google ganhou mais”. Em seguida, acrescenta: “a internet é um lugar livre. A mentira sempre existiu. São os leitores que precisam ficar atentos. Checar aquilo que leem. O avanço (das notícias falsas) é culpa deles”.
O jovem identifica-se apenas como Christian e foi entrevistado pela equipe do programa “Que Mundo é Esse?”, da GloboNews, para o documentário “Fake News – Baseado em fatos reais”, que vai ao ar no canal a cabo na noite de 30 de setembro.
Para quem ainda não sabe muito sobre o universo das notícias falsas, o trabalho vale a pena. Mostra, em detalhes, como os chamados “Veles boys” montaram sites usando publicadores simples como o WordPress, instalaram neles diversos espaços de banner com a ajuda do Google AdSense, publicaram informações absurdas sobre políticos americanos e encheram os bolsos com publicidade.
De acordo com o documentarista André Fran, Christian – sozinho – embolsava uma média de 20 mil euros por mês durante a campanha eleitoral dos Estados Unidos. Esse dinheiro agora vai pagar sua faculdade na Holanda. Christian quer estudar “gerenciamento de mídias sociais”.

‘CORRIDA DO OURO DIGITAL’

Para chegar a Veles, a equipe da GloboNews passou antes por Nova York, Londres, Moscou e Skopje, a capital da Macedônia. Entrevistou jornalistas, fact-checkers, professores e pesquisadores. Sua proposta era expor a chamada “corrida do ouro digital”. E, apesar de ter comprado a entrevista-chave do documentário (algo questionável entre jornalistas), conseguiu atingir a meta.
Na entrevista, deixada para o final da gravação, Christian não mostra qualquer remorso pelo que fez e, mais, faz troça daqueles que consumiram as besteiras por ele publicadas. “Os americanos são estúpidos. Acreditam em tudo. Os que apoiam Trump então… mais ainda”. O macedônio conta que ele e seus amigos testaram o posicionamento político que rendia mais cliques na internet: “Hillary não. Bernie Sanders também não. Trump vingou”. E assim surgiram postagens, por exemplo, como a que diz que o Papa Francisco apoiou o republicano na disputa eleitoral. Uma das grandes mentiras do ano passado.

NADA DE BRASIL

O documentário peca, no entanto, por não falar de Brasil. Supõe que o telespectador será capaz de transpor para a realidade brasileira o que acontece no resto do mundo. Mas talvez isso não seja tão simples assim. “Decidimos não falar de Brasil para não entrar no Fla-Flu de sempre”, defendeu Fran, ciente de que o país está a menos de um ano de suas eleições presidenciais e que notícia falsa já é um problema por aqui também. “E o programa se chama ‘Que Mundo é Esse’, né?”.
Ao encerrar a coletiva sobre seu trabalho, Fran acrescentou um ponto interessante que poderia ter tido mais destaque no filme: aquilo que chama de “caldo” para surgimento dos produtores de fake news.
“Na Macedônia, havia as condições perfeitas para isso: menores de idade que não podem trabalhar, desemprego altíssimo, e o país virou um local de outsourcing para empresas de tecnologia de todo o mundo. Aí veio o Trump. Juntaram jovens inteligentes, dispostos a ganhar dinheiro e pronto: fake news”.
Quem estava na sala viu algumas semelhanças com o atual cenário brasileiro. A conferir.
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