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Lupa
Damares erra sobre militância contra aborto, ataques de Bolsonaro a jornalista e orçamento do ministério
11.03.2020 - 07h00
Rio de Janeiro - RJ
No Dia Internacional da Mulher (8 de março), a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, fez um balanço das suas ações nessa área em entrevista para o Poder em Foco, no SBT. Ela respondeu a perguntas sobre ataques feitos pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) a jornalistas mulheres, sobre a pequena quantidade de ministras escolhidas para compor o governo e sobre políticas públicas de combate à violência contra a mulher. A Lupa selecionou algumas das frases da ministra para checar. Confira, a seguir, o resultado:
“Não faço nenhuma militância nem contra, nem a favor [da descriminalização do aborto] enquanto ministra”
Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em entrevista para o Poder em Foco, do SBT, em 8 de março de 2020
Falso
Enquanto ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves já se posicionou contra a descriminalização do aborto e apoiou ações “pró-vida”. Em março de 2019, a ministra apoiou o relançamento da Frente Parlamentar em Defesa da Vida e da Família, que visa, entre outras medidas, incentivar a mulher a não abortar em casos de estupro. Damares participou do evento de lançamento e chegou afirmar que “o recado do governo brasileiro na ONU foi que a nação brasileira agora protege a vida da criança desde a concepção”.
No dia 9 de março, um dia após a entrevista ao Poder em Foco, Damares disse no Twitter que a liberação do aborto é um “equívoco”. “Ainda bem que o Brasil é um país pró-vida. A vida é o primeiro direito humano. Temos que proteger a da mãe e a do bebê”, disse a ministra.
Em outro episódio polêmico, Damares criticou uma reportagem publicada pela revista Azmina que falava sobre os procedimentos recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para a realização do aborto. No Twitter, a ministra classificou a reportagem como absurda e disse que o material divulgado fazia apologia ao crime e que poderia colocar meninas e mulheres em risco. Ela falou ainda que iria denunciar a revista. No dia seguinte, a revista se manifestou sobre o caso e informou que tratou o assunto como saúde pública e que o veículo fez um trabalho jornalístico garantido pela liberdade de imprensa prevista na Constituição Federal.
Em nota, a assessoria de comunicação do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos disse que “posicionar-se sobre a questão do aborto não é o mesmo que fazer militância”, e diz que a ministra não deu palestras ou participou de passeatas desde que assumiu o cargo.

“Se você olhar aquela fala do furo [do presidente Jair Bolsonaro sobre a repórter Patrícia Campos Mello, da Folha de S.Paulo], ele fez uma fala reagindo a uma crítica da imprensa naquele momento”
Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em entrevista para o Poder em Foco, do SBT, em 8 de março de 2020
Falso
Em uma entrevista coletiva no dia 18 de fevereiro, o presidente Jair Bolsonaro fez uma piada e riu ao fazer uma falsa acusação à repórter Patrícia Campos Mello, da Folha de S.Paulo. Cercado por apoiadores, Bolsonaro disse que a jornalista queria “dar um furo a qualquer preço” – ou seja, teria oferecido favores sexuais para conseguir informações contra ele durante a campanha eleitoral de 2018. No trecho da entrevista em que usa essa frase, ele respondia sobre a federalização de investigações do caso Marielle. “Ficam inventando teses, para cada vez mais desgastar”, disse. Em seguida, falou sobre o caso da jornalista da Folha como um exemplo para essa afirmação.
A falsa acusação contra Mello foi feita originalmente por Hans River do Rio Nascimento, ex-funcionário de uma empresa de disparos de mensagens em massa, a Yacows, durante depoimento à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News em 11 de fevereiro. Ele havia sido fonte da repórter, que escreveu sobre o impulsionamento de mensagens por WhatsApp durante a campanha, usando o CPF de idosos sem que houvesse consentimento.
Reproduções de conversas divulgadas pela Folha mostram que quem se insinuou para Mello foi Nascimento. Ele a convidou para assistir a um show, insistiu por uma resposta, mas não teve retorno. Em nota, o jornal afirmou que repudia as mentiras e os insultos direcionados à repórter. A relatora da CPMI das Fake News, deputada federal Lídice da Mata (PSB-BA), entrou com uma representação na Procuradoria-Geral da República contra Nascimento, por falso testemunho. A jornalista entrou com ações contra Bolsonaro e o ex-funcionário da Yacows por conta das declarações falsas.
Em nota, a assessoria de comunicação do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos reafirmou que Bolsonaro estava “reagindo a uma provocação”.

“O meu presidente está investindo muito em políticas públicas para defender as mulheres no Brasil”
Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em entrevista para o Poder em Foco, do SBT, em 8 de março de 2020
Falso
Os repasses a um programa de combate à violência contra a mulher e ao órgão do governo responsável por esse trabalho sofreram redução drástica no governo Bolsonaro. Levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo no Portal da Transparência mostra que a verba do programa Casa da Mulher Brasileira, que prevê a construção de locais de atendimento para as vítimas, foi zerada no ano passado. Havia R$ 19,2 milhões empenhados, mas o governo não gastou nenhum centavo. Em 2015, foram gastos R$ 27 milhões com essa iniciativa.
O corte de verbas também afetou a Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres, que gastou R$ 5,3 milhões de R$ 7,6 milhões empenhados em 2019, e o atendimento às mulheres em situação de violência pelo ministério, que teve uma execução financeira de cerca de R$ 200 mil.
Em nota, a assessoria de comunicação do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos negou que os números que constam no Portal da Transparência estejam corretos. “Todos os R$ 19 milhões disponíveis para a construção da Casa da Mulher Brasileira foram repassados”, alega. Ela diz, ainda, que o programa terá R$ 46 milhões disponíveis para a construção de novas unidades.

“O nosso orçamento é de apenas R$ 200 milhões”
Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em entrevista para o Poder em Foco, do SBT, em 8 de março de 2020
Falso
O Orçamento de 2020 aprovado pelo Congresso destina R$ 637 milhões para o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. O número é mais do que o triplo do que foi citado pela ministra. Antes de ser alterada pelo Congresso, a proposta original apresentada pelo governo federal previa um valor menor para a pasta, de R$ 357 milhões. Ainda assim, a quantia era superior à mencionada por Damares na entrevista.
De acordo com os dados do Portal da Transparência, no ano passado foram executados apenas R$ 240,8 milhões. O Orçamento de 2019 previa R$ 470 milhões para o antigo Ministério dos Direitos Humanos, que foi transformado na atual pasta chefiada por Damares.
Em nota, a assessoria de comunicação do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos disse que a ministra se referia especificamente “ao orçamento discricionário e ao orçamento obrigatório”, que seriam no valor de R$ 170 milhões.

“Nós estamos com mais de 90 mulheres eleitas deputadas federais”
Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em entrevista para o Poder em Foco, do SBT, em 8 de março de 2020
Exagerado
A atual legislatura da Câmara dos Deputados conta com 77 deputadas federais – número 14% inferior ao que foi citado pela ministra Damares Alves na entrevista. A bancada feminina eleita em 2018 é a maior já registrada na história da Casa. Representa também 15% do total de integrantes da Câmara. O recorde anterior havia sido a eleição de 2014, quando a população elegeu 51 deputadas federais.
Passado pouco mais de um ano de mandato, o número manteve-se estável em 77 cadeiras. Duas parlamentares estavam licenciadas até esta segunda-feira (9): Tereza Cristina (DEM-MS), que saiu no início do ano passado para assumir o cargo de ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do governo Jair Bolsonaro; e Renata Abreu (PODE-SP), que está em licença-maternidade. No lugar de Cristina entrou Bia Cavassa (PSDB-MS). Abreu foi substituída pelo Dr. Sinval Malheiros (PODE-SP). Isso teria reduzido em a bancada feminina, mas o deputado Vinicius Gurgel (PL-AP) licenciou-se e uma mulher, Patricia Ferraz (PODE-AP), ocupou a sua vaga.
Em nota, a assessoria de comunicação do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos admitiu que houve um “ato falho” por parte da ministra. Ela se referia ao Congresso como um todo, incluindo as senadoras – o que elevaria o número total a 88, próximo à cifra citada pela ministra.

“A gravidez precoce no Brasil tem caído entre 15 e 19 anos”
Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em entrevista para o Poder em Foco, do SBT, em 8 de março de 2020
Verdadeiro
Os dados do DataSUS, do Ministério da Saúde, mostram que a gravidez  precoce entre 15 e 19 anos vem caindo no Brasil. Em dez anos, o percentual de meninas que ficaram grávidas e tiveram seus filhos nessa idade diminuiu 21%. Segundo o órgão, 458.777 meninas tiveram bebês em 2017, enquanto, em 2007, 582.409 adolescentes ficaram grávidas e tiveram filhos.

“Mas ela [gravidez precoce] não tem diminuído abaixo de 14 [anos]”
Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em entrevista para o Poder em Foco, do SBT, em 8 de março de 2020
Falso
Segundo os dados do DataSUS, do Ministério da Saúde, o número de meninas de 10 a 14 anos que ficaram grávidas caiu nos últimos anos – diferente do que afirmou a ministra. A gravidez precoce nessa faixa etária caiu 20,8% em dez anos. Ao todo, 22.146 meninas de 10 a 14 anos ficaram grávidas e tiveram bebês em 2017, último ano para consulta. Em 2007, o número era maior: 27.963 meninas grávidas.
Em nota, a assessoria de comunicação do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos diz que Damares queria dizer que “nessa faixa etária a queda tem sido menor” do que na demografia citada anteriormente, de meninas entre 15 e 19 anos. Nos últimos dez anos, a queda nessas duas faixas etárias foi na mesma proporção.
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