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Lupa na Ciência: Embora insuficiente, isolamento reduziu transmissão da Covid-19 pela metade no Rio e em SP
31.07.2020 - 12h00
Rio de Janeiro - RJ
O que você precisa saber:
  • Um estudo realizado pela Universidade de Oxford em parceria com 15 instituições brasileiras trouxe dados sobre a introdução do novo coronavírus no país e a forma como se espalhou ao longo dos meses
  • Os pesquisadores mostraram que decretos para o fechamento de escolas e lojas que reduziram a circulação de pessoas fizeram cair pela metade a taxa de transmissão do SARS-CoV-2 nas capitais do Rio de Janeiro e São Paulo
  • No entanto, as intervenções não-farmacêuticas adotadas até agora no país ainda são insuficientes para conter a epidemia
  • O grupo descobriu, ainda, que três linhagens do vírus vindas da Europa são responsáveis pela maior parte das contaminações no Brasil (76%)
Um estudo publicado nesta semana na revista Science trouxe dados importantes sobre a transmissão do novo coronavírus no Brasil. Intitulado Evolução e propagação da epidemia de SARS-Cov-2 no Brasil, ele indicou que as medidas de isolamento social adotadas mesmo depois de o vírus se espalhar reduziram pela metade a taxa de contaminação em algumas das principais cidades brasileiras. No entanto, elas foram insuficientes para conter o aumento de casos e mortes no país. Conduzida pela Universidade de Oxford em parceria com 15 instituições brasileiras, a pesquisa foi feita a partir de uma detalhada análise epidemiológica que avaliou registros de casos da doença, mobilidade de pessoas medida por telefones celulares e as relações entre os genomas do vírus sequenciados.
O Brasil é o segundo país com mais casos e óbitos por Covid-19 no mundo. Ao contrário de outras nações que diminuíram significativamente o número de ocorrências após um período crítico inicial, como Itália, Espanha ou Reino Unido, o SARS-CoV-2 continua a se espalhar em diversas regiões do país meses depois do início da pandemia. Na ausência de uma vacina ou medicamento para frear ou curar a Covid-19, a forma de conter a propagação do novo coronavírus tem sido por meio de intervenções não-farmacêuticas (NPIs), como distanciamento social e uso de máscaras.
Para avaliar o impacto das NPIs relacionadas à circulação de pessoas nas cidades do Rio de Janeiro (6,7 milhões de habitantes) e de São Paulo (12,2 milhões de habitantes), os maiores municípios do país, os pesquisadores utilizaram um modelo estatístico baseado na mobilidade urbana, que avaliou o número de reprodução R do novo coronavírus em diferentes períodos. O valor R determina o potencial de propagação de um vírus dentro de condições específicas. Se R>1 (superior a 1), cada pessoa transmite a doença a pelo menos uma outra pessoa, e o vírus se dissemina. Se R<1 (menor do que 1), cada vez menos indivíduos se infectam e é possível controlar sua propagação.
Os pesquisadores calcularam esse valor R nas duas cidades em diferentes períodos, de acordo com a redução na circulação de pessoas que ocorreu a partir dos decretos implementados pelos governos. Para o estudo, foram considerados como NPIs o fechamento de escolas e de lojas decretados entre 12 e 23 de março de 2020.
No início da epidemia no Brasil, os pesquisadores encontraram um R>3 em São Paulo e no Rio de Janeiro. Isso significa que cada pessoa contaminava até outras três. Já nas primeiras semanas após as NPIs serem decretadas, o valor de R chegou a ser menor que 1 em São Paulo, e próximo a esse valor no Rio. Isso se deu porque a taxa de isolamento chegou a alcançar os 60%. No entanto, após esse decréscimo inicial significativo, as pessoas voltaram a circular um pouco mais, e a partir das semanas seguintes o R ficou entre 1,0 e 1,6 tanto em São Paulo como no Rio, número que se manteve nos meses seguintes. Ou seja, o potencial de propagação caiu pela metade, mas as medidas adotadas até agora ainda não são suficientes para conter o avanço da Covid-19.

Outras conclusões

Além das informações específicas sobre os dois maiores centros urbanos do país, os pesquisadores trouxeram dados interessantes sobre a propagação do vírus no território nacional. Eles sequenciaram 427 genomas do SARS-CoV-2 a partir de amostras coletadas em 85 municípios de 21 Estados brasileiros. A partir daí, identificaram que havia 18 subtipos (linhagens) diferentes do vírus introduzidos no Brasil. Três dessas linhagens, de origem europeia, entraram no país entre fevereiro e março, foram as que se espalharam em maior intensidade, e são responsáveis por 76% das contaminações.
Além disso, o grupo concluiu que houve mais de 100 introduções distintas do patógeno no país, sendo a maioria em regiões metropolitanas com voos internacionais, como Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte (MG) e Fortaleza (CE). A disseminação do patógeno, de acordo com os dados coletados, ocorreu inicialmente dentro das capitais de São Paulo e Rio de Janeiro, avançou pelo interior destes estados e, depois, chegou a outras regiões por pessoas contaminadas que viajaram dentro do país.
Nas conclusões do estudo, assinado por 81 cientistas, os pesquisadores foram enfáticos ao afirmar que a epidemia ainda está fora de controle no país e que, com o relaxamento das taxas de isolamento social, é preciso ampliar outras medidas como testagem ampla, distanciamento social coordenado e rastreamento de contatos. Esta última, que se mostrou eficaz no controle de propagação do vírus em outros países, como a Coreia do Sul, nunca foi adotada pelo Brasil em maior escala. “Este estudo joga luz sobre a transmissão epidêmica e as trajetórias evolutivas das linhagens de SARS-CoV-2 no Brasil e fornece evidência de que as intervenções atuais continuam insuficientes para manter a transmissão do vírus sob controle no país”, concluíram.
Fontes:
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