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É falso que vacinados contra a Covid-19 estão desenvolvendo aids
25.10.2021 - 19h50
Rio de Janeiro - RJ
Correção às 21h42 de 26 de outubro de 2021: O texto foi alterado para incluir o título original da reportagem publicada na Exame e destacar que aquele texto sofreu alterações posteriores à publicação. Também foi inserido mais contexto, no penúltimo parágrafo, sobre a alegação do presidente Jair Bolsonaro de que teria se baseado nessa matéria em sua live semanal.
Circula pelo WhatsApp que dados do governo britânico mostrariam que pessoas totalmente vacinadas estão desenvolvendo a síndrome da imunodeficiência adquirida (aids). Uma peça semelhante de desinformação foi lida pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em live na última quinta-feira (21). Por WhatsApp, leitores da Lupa sugeriram que esse conteúdo fosse analisado. Confira a seguir o trabalho de verificação​:
“Os dados disponibilizados pelo governo britânico mostram que os vacinados em dose dupla estão desenvolvendo a síndrome da imunodeficiência adquirida. Pessoas de 40 a 69 anos que receberam a dose dupla já perderam 40% da função do sistema imunológico”
Trecho de publicação do site StyloUrbano que circula no WhatsApp.
Falso
A informação analisada pela Lupa é falsa. Não existe qualquer evidência de que a vacinação contra a Covid-19 esteja relacionada ao desenvolvimento da aids. O texto do site que circula pelas redes sociais chega a essa conclusão a partir da interpretação equivocada de tabelas que mostrariam um suposto “dano progressivo” causado ao sistema imunológico pela imunização. No entanto, a aids é uma doença viral, cujo causador é um vírus transmitido exclusivamente pela troca de determinados fluidos corporais – o que torna impossível sua relação com os imunizantes contra a Covid-19.
O texto analisado, publicado em 14 de outubro, reproduz as informações de um site antivacina do Reino Unido. Nele, relatórios de vigilância produzidos pela agência de saúde Public Health England (PHE) sobre a vacinação contra a Covid-19 são distorcidos, gerando uma interpretação equivocada acerca da eficiência dos imunizantes.
A partir da comparação dos índices de casos da doença entre vacinados e não vacinados, o site diz que a imunidade conferida pelas vacinas cairia a cada semana. No entanto, para muito além da queda na taxa de proteção, esses dados supostamente indicariam um dano permanente ao sistema imunológico — a ponto de que pessoas com mais de 30 anos perderiam 100% da capacidade imunológica em um prazo de seis meses. Não há qualquer base científica nessa afirmação. Além disso, nenhuma dessas conclusões é possível com base nas informações do PHE. O site chama esse “dano progressivo” de Síndrome da Imunodeficiência Adquirida, mais conhecida como aids.
As tabelas analisadas equivocadamente pelo site existem, mas tiveram colunas extras adicionadas que jamais foram publicadas pelo PHE. Também não há qualquer menção à aids ou ao vírus HIV nos documentos. Os próprios relatórios da agência de saúde alertam para o “alto risco de interpretações indevidas”, reforçando que as informações ali presentes não são o método mais adequado para avaliar a eficácia das vacinas.
O HIV, que é o vírus causador da aids, é transmitido por meio de fluidos corporais como sangue, leite materno, sêmen e secreções vaginais, segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). Ao receber a vacina contra a Covid-19 por meio de uma seringa não utilizada, não há qualquer risco de contrair o HIV e, consequentemente, desenvolver a aids.
Por meio de nota, o Comitê de HIV/Aids da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) aponta que “não se conhece nenhuma relação entre qualquer vacina contra a Covid-19 e o desenvolvimento de síndrome da imunodeficiência adquirida”. A publicação reforça que as pessoas que vivem com HIV/aids devem se vacinar completamente para a Covid-19. O Ministério da Saúde recomenda, inclusive, que esse grupo tome a dose de reforço. A orientação é baseada em estudos científicos que apontam que pessoas que vivem com HIV/aids normalmente apresentam resposta reduzida às vacinas.
A Sociedade Paulista de Infectologia também desmentiu essa desinformação. Em nota, a entidade enfatizou que não existe nenhum relatório oficial ou estudo científico que comprove que as pessoas totalmente vacinadas estejam desenvolvendo a aids. A instituição considera inadmissível que autoridades políticas “divulguem informações falsas que somente contribuem para a desconfiança e hesitação de certos setores da população”. Por conta das alegações falsas sobre as vacinas contra a Covid-19, a live semanal de Bolsonaro foi apagada por Facebook e Instagram na noite de domingo (24).
O presidente disse que sua fala se baseou em uma reportagem publicada pela Exame. “Na segunda-feira, a revista Exame fez uma matéria sobre vacina e aids, eu repeti essa matéria na minha ‘live’, dois dias depois a revista Exame falou que eu falei fake news. Foi a própria Exame que falou da relação de HIV e vacina. Eu apenas falei sobre matéria da revista Exame”, alegou, em entrevista à rádio Caçula FM nesta segunda-feira (25). Bolsonaro, contudo, não se referiu à Exame em sua live como fonte das suas afirmações. Durante a transmissão de quinta-feira, ele só mencionou os supostos relatórios do governo britânico que trariam esse dado sobre a aids – o que não está presente na matéria. Embora o vídeo tenha sido excluído das redes sociais por causa do conteúdo enganoso, trechos disponíveis na web também mostram que, ao ler as supostas notícias sobre o assunto, ele segura uma folha impressa com palavras em inglês.
O texto da Exame não é recente – foi publicado em outubro de 2020 com o título “Algumas vacinas contra a Covid-19 podem aumentar o risco de HIV”. Segundo a matéria, um grupo de pesquisadores alertou para o periódico médico The Lancet que algumas vacinas contra a Covid-19, em desenvolvimento na época, potencialmente aumentariam o risco de infecção por HIV devido à utilização de um adenovírus específico. Após a afirmação falsa do presidente, o título da reportagem foi alterado duas vezes, ficando da seguinte forma em 26 de outubro: “Out/2020: Algumas vacinas contra a Covid-19 podem aumentar o risco de HIV?”.  Também houve mudanças no subtítulo e no próprio texto para deixar claro que ainda não há comprovação de que isso esteja ocorrendo com algumas vacinas contra Covid-19. Além disso, nenhum dos imunizantes aplicados no Brasil usa esse tipo de adenovírus.
Essa informação também foi verificada por Fato ou Fake e Aos Fatos.
Nota sobre a correção feita em 26 de outubro de 2021 – Segue, abaixo, a versão original dos dois últimos parágrafos, que foram alterados:
O presidente disse que sua fala se baseou em uma reportagem publicada pela Exame. “Na segunda-feira, a revista Exame fez uma matéria sobre vacina e aids, eu repeti essa matéria na minha ‘live’, dois dias depois a revista Exame falou que eu falei fake news. Foi a própria Exame que falou da relação de HIV e vacina. Eu apenas falei sobre matéria da revista Exame”, alegou, em entrevista à rádio Caçula FM nesta segunda-feira (25).
O texto mencionado foi publicado em outubro de 2020 com o título “Algumas vacinas contra a Covid-19 podem aumentar o risco de HIV?”. Segundo a matéria, um grupo de pesquisadores alertou para o periódico médico The Lancet que algumas vacinas contra a Covid-19, em desenvolvimento na época, potencialmente aumentariam o risco de infecção por HIV devido à utilização de um adenovírus específico. Porém, a revista reforçou que “não se comprovou que alguma vacina contra a Covid-19 reduza a imunidade a ponto de facilitar a infecção em caso de exposição ao vírus”. Além disso, nenhum dos imunizantes aplicados no Brasil usa esse tipo de adenovírus.
Esta‌ ‌verificação ‌foi sugerida por leitores através do WhatsApp da Lupa. Caso tenha alguma sugestão de verificação, entre em contato conosco pelo número +55 21 99193-3751.
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