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Vitaminas D e B12, zinco, NAC e montelucaste não são eficazes para prevenir ou tratar a dengue
14.02.2024 - 14h00
Florianópolis - SC
Circula pelas redes sociais que a ivermectina, o zinco e as vitaminas D e B12 são tratamentos cientificamente comprovados contra a dengue. Em post publicado por um nutrólogo, são indicados ainda medicamentos, como N-acetilcisteína (NAC) e montelucaste, seguidos de links para estudos que supostamente comprovariam a eficácia antiviral e contra o desenvolvimento de formas graves da infecção. 
É falso. Os estudos não comprovam a eficácia dessas substâncias para tratar ou prevenir a infecção pela dengue.
Por WhatsApp, leitores da Lupa sugeriram que esse conteúdo fosse analisado. Confira a seguir o trabalho de verificação​:
“#Dengue, como eu Trato:
1) #Ivermectina (acelera a eliminação do vírus do organismo)
– Trecho de legenda de post publicado no Instagram que circula no WhatsApp
Falso
A ivermectina não tem nenhuma ação contra o vírus da dengue ou no tratamento da doença. O medicamento é indicado para tratar sarna e piolho. Embora tenham sido realizados vários estudos nos últimos anos sobre possíveis efeitos antivirais desse fármaco, até o momento nenhum demonstrou evidências de que o antiparasitário de fato acelere a eliminação do vírus no organismo ou seja eficaz contra formas graves da dengue. 
Como explicado pela Lupa, um artigo publicado na iScience, em outubro de 2023, mostrou que uma combinação de ivermectina-atorvastatina reduziu a infecção por dengue — contudo, esse efeito foi verificado apenas in vitro, ou seja, em laboratório, e em camundongos. Esse estudo tem uma série de limitações e reforça que "ainda não existe um tratamento específico para esta doença [dengue]". 
Vale pontuar que a pesquisa citada pelo autor, publicada na Clinical Infectious Diseases, em janeiro de 2021, de fato mostra um ensaio randomizado, duplo-cego e controlado por placebo para testar a eficácia da ivermectina como medicamento antiviral para dengue em 238 pacientes que tinham a doença. 
Entretanto, os próprios autores concluíram que, embora tenha algum potencial, a eficácia clínica da ivermectina contra a dengue não foi observada. Isso significa que não foram identificadas diferenças na eliminação da viremia ou da febre, por exemplo, entre o grupo que recebeu placebo e o grupo que foi medicado com ivermectina. Os pesquisadores sinalizaram que as evidências, até o momento, são “preliminares”. Essa informação foi omitida no post. Além disso, comentário feito pelos editores da revista afirma que é preciso "cautela" com os resultados obtidos.
“2) #VitaminaD (melhora a atividade macrofágica contra o vírus)
– Trecho de legenda de post publicado no Instagram que circula no WhatsApp
Falso
Não existe nenhuma substância específica capaz de combater a ação viral da dengue ou que impeça que indivíduos desenvolvam um quadro mais grave da doença. Muitos estudos observacionais que relacionam os níveis de vitamina D e a gravidade da dengue já foram feitos. Contudo, até o momento, nenhum comprovou que a suplementação com essa vitamina de fato possa combater a infecção.
A pesquisa citada na publicação, por exemplo, analisa amostras de sangue — e não pacientes — de pessoas saudáveis que ​​foram suplementadas com 1.000 e 4.000 UI por dia dia de vitamina D durante 10 dias. Depois, essas amostras de sangue foram “infectadas” com DENV-2, um dos sorotipos do vírus da dengue. 
Os cientistas verificaram que as amostras do sangue de pessoas que receberam doses mais altas de vitamina exibiram maior resistência à infecção. Contudo, eles evidenciam que o estudo foi feito em laboratório e que mais testes são necessários para determinar a viabilidade da vitamina D como agente antiviral. Essa informação foi omitida pelo autor da publicação. 
“3) #Zinco (melhora a ativação das respostas de defesa antiviral)
– Trecho de legenda de post publicado no Instagram que circula no WhatsApp
Falso
Assim como a vitamina D, o zinco tem sido testado há anos por seu papel em infecções por alguns vírus, incluindo o vírus da dengue. Contudo, até o momento, não existem evidências de que esse elemento químico de fato melhore as defesas do organismo contra os sorotipos da dengue.
O estudo citado na publicação testou o comportamento desse micronutriente em uma cultura de células dentro de um laboratório, e não em seres humanos. Essa informação foi omitida na legenda. Não há, portanto, como extrapolar seus resultados para o corpo humano.
Muitas das pesquisas já realizadas com essa substância relacionam a deficiência de zinco, especialmente identificada em crianças que vivem em países em desenvolvimento, com a duração da doença. Em 2019, por exemplo, um ensaio randomizado controlado analisou o papel da suplementação com zinco como terapia adjuvante contra a dengue em crianças na Tailândia. Eles descobriram que a suplementação com esse micronutriente na admissão hospitalar por dengue pode contribuir para encurtar o tempo de internação. 
Os pesquisadores enfatizaram, no entanto, que o estudo tinha algumas limitações, entre elas o número limitado de participantes e nenhum caso grave de dengue entre eles. 
“4) #NAC (protege o fígado contra a ação viral) https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33177895/ (...)”
– Trecho de legenda de post publicado no Instagram que circula no WhatsApp
Falso
NAC é a sigla para N-acetilcisteína, expectorante indicado para tratamento da bronquite e outras doenças pulmonares. Não existem evidências robustas de que esse medicamento possa proteger o fígado em caso de infecção pelo vírus da dengue. 
O estudo citado pelo autor da publicação mostra o papel desse fármaco em casos de pessoas que desenvolveram insuficiência hepática aguda após infecção por dengue. Os pesquisadores concluíram que, embora a NAC tenha “potencial” para ser usada como terapia — especificamente em casos de insuficiência hepática associada à dengue —, ainda são necessários ensaios clínicos randomizados e mais pesquisas para confirmar sua eficácia.
Eles também pontuaram que são necessárias mais investigações para entender exatamente qual é o mecanismo de ação da NAC na doença hepática induzida pela dengue.
Vale pontuar que a NAC é estudada como possível antídoto em caso de intoxicação por paracetamol, analgésico costumeiramente indicado para tratar sintomas da dengue. De acordo com artigo publicado por uma pesquisadora da Universidade Federal da Paraíba, a NAC “reduz a toxicidade do paracetamol” se administrada até 8 horas depois de uma superdosagem.
“5)#VitaminaB12 (Previne e trata a Plaquetopenia) https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31321933/ (...)”
– Trecho de legenda de post publicado no Instagram que circula no WhatsApp
Falso
Como já explicado, não existe tratamento específico contra a infecção por dengue. Tampouco existem medicamentos ou substâncias capazes de prevenir formas graves da doença — que podem levar um indivíduo a desenvolver plaquetopenia (quando a contagem das plaquetas no sangue está abaixo do considerado normal).
Em nenhum momento, o estudo citado na publicação afirma que a B12 comprovadamente previne e trata hemorragias causadas pela dengue. Os resultados da pesquisa apenas 
demonstram que a deficiência de vitamina B12 pode ser um dos fatores que contribui para o desenvolvimento de trombocitopenia (número baixo de plaquetas que pode levar à hemorragia) grave em pessoas infectadas pela dengue.
“6) #Montelucaste (Reduz o aparecimento de formas graves) https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33601858/
Todos os ativos e medicamentos citados estão embasados cientificamente, publicados em revistas de confiança e revisado por pares, como manda a exigência da MBE (medicina baseada em evidência). (...)”
– Legenda de post publicado no Instagram que circula no WhatsApp
Falso
O montelucaste é um medicamento indicado para o tratamento de sintomas da asma — e não para prevenir formas graves da dengue. Não existe uma terapia específica capaz de tratar a dengue ou evitar que ela se agrave. 
Um estudo randomizado duplo cego recente, publicado em 2 de fevereiro de 2024 na PLOS Neglected Tropical Diseases Journal, testou em 358 pacientes um tratamento com 10mg de montelucaste por dez dias. Metade do grupo tomou um placebo. Os pesquisadores concluíram que esse medicamento não previne a dengue nem suas formas graves e recomendam mais pesquisas para avaliar minuciosamente o potencial benefício do fármaco. 
Além disso, o estudo citado pelo autor da publicação não é definitivo. Os cientistas avaliaram o tratamento com o montelucaste em um teste clínico randomizado e controlado com 200 pacientes com dengue na Índia. Metade foi tratada com 10 mg do fármaco uma vez ao dia durante cinco dias, junto a um atendimento padrão de manejo clínico (tratamento dos sintomas, hidratação, observação etc). A outra metade recebeu apenas o tratamento padrão de manejo clínico.
Embora tenham identificado um potencial dessa droga para proteger pacientes de casos graves da dengue, os pesquisadores pontuaram uma série de limitações, entre as quais a falta de teste com outras dosagens de montelucaste. Além disso, eles não tinham dados sobre carga viral ou sorologia dos infectados. Com isso, não puderam concluir se, de fato, havia uma ligação entre a carga viral e tipo de infecção com resposta ao tratamento. Por fim, recomendaram mais estudos para investigar a dosagem ideal e duração do tratamento.

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