Em Porto Alegre, Melo erra sobre indicador na saúde e gestão na educação

Jornalismo

Eleições 2024

03.09.2024 - 18h30

Carol Macário e Maiquel Rosauro

Rio de Janeiro - RJ

O texto foi atualizado com informações enviadas pela assessoria do candidato Sebastião Melo

10.09.2024 - 14h57

O prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição Sebastião Melo (MDB) foi sabatinado nesta terça-feira (3) pela Rádio Gaúcha. Na entrevista, foi questionado sobre erros e acertos de sua gestão durante a tragédia climática que resultou na maior enchente da história da cidade, em maio deste ano. Se reeleito, prometeu revisar a planta de valores dos imóveis atingidos pelos alagamentos no 4º Distrito, na região central.

Melo errou ao afirmar que a capital gaúcha tem o melhor indicador da atenção primária em saúde do Brasil e também ao afirmar que agiu rapidamente ao afastar a ex-secretária municipal de Educação, Sônia da Rosa, diante de indícios de irregularidades na pasta.

O prefeito exagerou os resultados do programa Alfabetiza + POA e o número de equipamentos públicos afetados pela enchente. Melo ainda subestimou a quantidade de municípios gaúchos que serão beneficiados pelo Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo federal.

A Lupa já checou a entrevista da deputada federal e candidata à prefeita Maria do Rosário (PT). Outros candidatos serão sabatinados pela Gaúcha. Na quarta-feira (4) é a vez do candidato Felipe Camozzato (Novo).

A Lupa checou algumas das declarações de Sebastião Melo. A assessoria de imprensa do candidato foi procurada e as respostas enviadas pela equipe serão incluídas na checagem.

“Porto Alegre é reconhecida como o melhor indicador de atenção básica [em saúde]”

– Sebastião Melo (MDB), prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição, em entrevista à Rádio Gaúcha no dia 3 de setembro de 2024

Falso

A capital gaúcha não é a cidade com melhor indicador de atenção básica em saúde do país. Se considerar o ranking do programa Previne Brasil, modalidade de financiamento do Ministério da Saúde que avalia a qualidade da atenção primária nos municípios, Porto Alegre ficou em segundo lugar (nota 8,5) — e não em primeiro — apenas no ranking das capitais, e não de todas as cidades, na edição de fevereiro de 2024, a mais recente. A capital do Amazonas, Manaus, ficou em primeiro lugar entre as capitais, com nota 8,8.

Na edição de fevereiro deste ano, vários outros municípios brasileiros receberam a nota máxima, 10, nos indicadores do programa. Só no estado do Ceará, por exemplo, 43 cidades alcançaram a nota máxima.

Um outro levantamento, o Ranking Connected Smart Cities 2024, mostrou que Porto Alegre ocupa a 58ª posição dentre as cidades com a melhor saúde pública do país — a cidade caiu 31 posições em relação ao ano passado, quando estava em 27º lugar. O estudo foi desenvolvido pela Urban Systems em parceria com a empresa Necta a partir de dados do Censo 2022 e de pesquisas divulgadas por órgãos oficiais. Para chegar à nota em saúde, foram considerados indicadores como número de leitos e de médicos por habitantes, cobertura populacional de atenção primária à saúde, despesas com saúde, mortalidade infantil, entre outros.

“Construir um plano de reconstrução da cidade [após as enchentes], o que foi feito”

– Sebastião Melo (MDB), prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição, em entrevista à Rádio Gaúcha no dia 3 de setembro de 2024

Verdadeiro

A Prefeitura de Porto Alegre apresentou, em 19 de junho, um plano estratégico para reconstrução da cidade. O projeto prevê um investimento de R$ 890 milhões, sendo que R$ 510 milhões serão direcionados ao plano de proteção contra cheias, o que inclui obras em diques, comportas, casas de bombas e no Muro da Mauá.

“Esse plano [de reconstrução da cidade] envolve mais de 300 equipamentos públicos que foram danificados, alguns totalmente outros parcialmente”

– Sebastião Melo (MDB), prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição, em entrevista à Rádio Gaúcha no dia 3 de setembro de 2024

Exagerado

Levantamento da Prefeitura de Porto Alegre, divulgado na apresentação do plano estratégico de reconstrução da cidade, apontou que 218 equipamentos municipais foram impactados com a enchente, sendo 17 na área de saúde, 14 na educação, 161 em áreas verdes, 10 áreas sociais e 16 em demais serviços públicos.

“Não demorei, não. Afastamos a secretária [de Educação] rapidamente. Ela pediu demissão tão logo o assunto veio à tona, ela pediu demissão”

– Sebastião Melo (MDB), prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição, em entrevista à Rádio Gaúcha no dia 3 de setembro de 2024

Falso

Os primeiros indícios de irregularidades na Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre (Smed) foram divulgados pelo jornal Zero Hora, em 6 de junho de 2023, apontando que escolas da rede municipal acumulavam, em seus corredores, caixas de livros e equipamentos eletrônicos comprados com dinheiro público, mas sem uso. Dois dias depois, o veículo mostrou que escolas municipais acumulavam aparelhos de ar condicionado à espera de reforma na rede elétrica.

Em 14 de junho de 2023, Zero Hora divulgou que equipamentos esportivos e recreativos comprados em novembro de 2022 pela Smed, ao custo de R$ 808 mil, estavam estocados em um galpão no bairro Navegantes. Na mesma data, o jornal também noticiou que um depósito alugado no bairro Jardim Botânico é usado pela Smed há um ano para guardar livros, computadores, móveis e outros materiais que ainda não chegaram às escolas municipais.

A então secretária municipal de Educação, Sônia da Rosa, deixou o cargo apenas no dia 18 de junho, após pedir exoneração — conforme comunicado oficial no site da Prefeitura. Ou seja, ela não deixou a Smed tão logo o assunto veio à tona, mas apenas 12 dias depois.

Em resposta enviada à Lupa, a assessoria de Melo disse que não cabe ao prefeito condenar ninguém por antecipação e que tão logo as denúncias vieram à tona, o prefeito agiu. “Melo determinou no dia 7 de junho a abertura de auditoria especial na Secretaria Municipal de Educação (Smed) para apurar os procedimentos de destinação dos materiais e equipamentos adquiridos para a rede municipal de ensino. Também foi criado comitê gestor operacional para concluir a distribuição e instalação dos produtos, incluindo providências de infraestrutura nas escolas necessárias à operação desses equipamentos”. Já o afastamento da ex-secretária do cargo — informação que consta na frase checada — aconteceu onze dias após a abertura da auditoria e doze dias após a publicação da primeira denúncia.

“O PAC [Plano de Aceleração do Crescimento] envolve obras de proteção de cheias em 32 municípios”

– Sebastião Melo (MDB), prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição, em entrevista à Rádio Gaúcha no dia 3 de setembro de 2024

Subestimado

O governo federal anunciou, em 30 de julho, investimentos de R$ 7,4 bilhões para o Rio Grande do Sul no Novo PAC Seleções, o que inclui mais de R$ 6,5 bilhões em 42 municípios gaúchos para reduzir os riscos de alagamentos, enchentes e inundações com obras de drenagem urbana sustentável e manejo de águas pluviais. Desse total, R$ 2 bilhões serão destinados à recuperação ou readequação de equipamentos de proteção como bombas de escoamento.

“O Ideb de Porto Alegre é ruim no nosso governo, mas é ruim nos governos anteriores também”

– Sebastião Melo (MDB), prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição, em entrevista à Rádio Gaúcha no dia 3 de setembro de 2024

Verdadeiro

De acordo com o histórico de notas do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), desde 2005 a capital gaúcha não atinge a meta do indicador estabelecida pelo Ministério da Educação — tanto nos anos iniciais quanto nos anos finais do ensino fundamental.

Se considerar os anos iniciais do ensino fundamental nas escolas públicas municipais, as notas foram 3,6 em 2005; 3,9 em 2007; 4,1 em 2009 e entrou numa crescente a partir de 2011, quanto a nota foi de 4,4. Chegou a 5,2 em 2021 e voltou a cair em 2023, quando chegou a 4,7 pontos.

Já nos anos finais nas escolas municipais, a nota é ainda mais baixa. Em 2005 a nota era de apenas 3,2 e manteve a média abaixo de 4 pontos até 2021, quando subiu para 4,8. Em 2023, voltou a cair e a média final foi de 3,8 pontos.

“Esse é um papel indelegável da Prefeitura [proteção contra cheias], que tem fazer rapidamente e nós estamos fazendo”

– Sebastião Melo (MDB), prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição, em entrevista à Rádio Gaúcha no dia 3 de setembro de 2024

Contraditório

Um documento assinado por 42 engenheiros, geólogos e técnicos de saneamento afirma que o sistema de proteção contra inundações de Porto Alegre falhou porque não recebeu a manutenção necessária. Consideração semelhante foi feita no relatório do Programa do Governo Holandês de Redução de Risco de Desastres e Suporte a Surtos (DRRS) sobre a enchente na capital gaúcha, que citou a existência de uma aparente falta de manutenção dos equipamentos e um retorno do escoamento nas bombas devido à falta de válvulas de retenção (página 17). Logo, Melo se contradiz ao alegar que a Prefeitura necessita agir rapidamente na proteção contra cheias, quando a manutenção do sistema, de acordo com os dois estudos, não foi realizada.

Já após a inundação, em 19 de junho, a prefeitura de fato lançou um plano estratégico para reconstrução da cidade que prevê o investimento de R$ 510 milhões na proteção contra cheias. A primeira obra emergencial teve início em 30 de agosto, nos diques do bairro Sarandi. A intervenção da Prefeitura busca elevar o nível do dique da Fiergs para 5,5 metros em toda a sua extensão. Em paralelo, será realizado o trabalho de melhoria dos acessos ao dique do Sarandi que, em maio, apresentou pontos de extravasamento. O custo das intervenções é de R$ 10 milhões, com recursos próprios.

Também estão previstas novas comportas no sistema de proteção contra cheias do município. Em 26 de agosto, foi definida a empresa que irá elaborar os estudos.

“Não é o Melo que está sendo investigado [por um suposto caso de corrupção na Secretaria Municipal de Educação]”

– Sebastião Melo (MDB), prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição, em entrevista à Rádio Gaúcha no dia 3 de setembro de 2024

Verdadeiro

A Polícia Civil deflagrou, em 23 de janeiro, a Operação Capa Dura, que investiga supostos delitos que teriam sido cometidos por gestores públicos e empresários em compras de livros didáticos e de literatura pela Secretaria Municipal da Educação de Porto Alegre (Smed). Na ocasião, quatro pessoas foram alvo de prisão temporária: a ex-secretária municipal de Educação Sônia da Rosa, a ex-assessora Mabel Luiza Leal Vieira, a ex-coordenadora pedagógica Michele Bartzen e o empresário Jailson Ferreira da Silva.

Na segunda fase da operação, em 5 de julho, estavam entre os alvos Sônia Rosa, o ex-secretário-adjunto Mário de Lima e a professora municipal cedida ao Gabinete do Prefeito Lia Wilges, além de outros servidores públicos, empresários e representantes comerciais. Investigação da Polícia Civil aponta que Rosa teria recebido R$ 300 mil de propina enquanto atuava na Smed.

Embora nenhuma das operações da Polícia Civil tivesse Melo como alvo, o advogado do empresário Jailson Ferreira da Silva, suspeito de fraudes licitatórias e pagamento de propina em negócios com a Smed, apresentou petição pelo deslocamento de competência do caso por possível envolvimento de Melo, o que faria a investigação passar da primeira instância para o Tribunal de Justiça. Contudo, o pedido foi negado pelo juiz substituto Jaime Freitas da Silva, da 1ª Vara Estadual de Processo e Julgamento dos Crimes de Organização Criminosa e Lavagem de Dinheiro, por entender que Melo não é alvo da investigação.

“Esse mês de julho, superamos o emprego — são 596 vagas a mais daquilo que estava lá atrás”

– Sebastião Melo (MDB), prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição, em entrevista à Rádio Gaúcha no dia 3 de setembro de 2024

Subestimado

Conforme dados do Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Novo Caged), em julho, Porto Alegre registrou um saldo positivo de 686 vagas formais de emprego — e não 596 como disse Melo. Naquele mês, ocorreram 23.288 admissões contra 22.602 desligamentos.

Julho foi o primeiro mês, desde a enchente de maio, em que o município apresentou mais contratações do que demissões. Em maio, foram 2.606 empregos a menos na cidade e, em junho, 1.203, totalizando 3.809 desligamentos em um período de dois meses.

“Criamos um programa chamado Alfabetiza +Poa, que está no meio do caminho e que melhorou um pouco do ponto de vista do 1º e 2º ano do aprendizado”

– Sebastião Melo (MDB), prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição, em entrevista à Rádio Gaúcha no dia 3 de setembro de 2024

Exagerado

O programa Alfabetiza +Poa foi lançado em novembro de 2022 pela gestão de Sebastião Melo com a proposta de promover a alfabetização das crianças da rede pública municipal. Se considerar, contudo, as taxas de aprovação do 1º e 2º ano das séries iniciais medidas pelo Inep, instituto vinculado ao Ministério da Educação que também mede o Ideb, as notas ainda estão menores se comparadas com 2019, antes do atual prefeito assumir e antes do programa ser lançado. É exagerada, portanto, a afirmação de que o projeto já tenha impactado na melhora desses índices.

Em 2019, por exemplo, a taxa de aprovação do 1º e 2º ano das séries iniciais das escolas públicas municipais era de 99,9% e 99,6%, respectivamente. Caiu para 98,4% em ambas as séries em 2021 e, em 2023, teve um ligeiro aumento: 99,3% no 1º ano e 99,5% no 2º ano — abaixo da taxa de 2019.

A nota geral do Ideb para anos iniciais (1º ao 5º ano) também é uma medida para avaliar o desempenho dos alunos. Esses índices caíram em 2023 (quando a nota foi 4,7) em relação a 2019 (nota 4,9) — embora tenha aumentado na avaliação de 2021, quando chegou a 5,2.

“Nós temos 52 [%] hoje de esgoto tratado”

– Sebastião Melo (MDB), prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição, em entrevista à Rádio Gaúcha no dia 3 de setembro de 2024

Verdadeiro

De acordo com o Ranking do Saneamento 2023, feito pelo Instituto Trata Brasil, 52,7% do esgoto da capital gaúcha era tratado no ano passado (página 100). No Ranking de 2020 — ano anterior ao início da gestão de Melo, Porto Alegre contava com 49,1% do esgoto tratado (página 115).

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