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Em 10 minutos, família perde quase R$ 500 em golpe promovido no Facebook
27.05.2025 - 16h00
Rio de Janeiro - RJ
Em anúncios na Meta, golpistas forjam falso concurso de agente comunitário do Ministério da Saúde para aplicar golpe. Imagem: Reprodução.
Por volta das 8h da manhã de quinta-feira (22), a funcionária pública Patricia Aparecida Soares foi fisgada por um anúncio no Instagram que promovia vagas para agentes de saúde em um suposto processo seletivo do Ministério da Saúde. Clicou, preencheu seus dados e seguiu até a etapa final da inscrição. Só então, ao se deparar com uma exigência de pagamento via Pix, percebeu que se tratava de um golpe. 
Antes de desconfiar do esquema, ela havia compartilhado o link fraudulento com familiares. Em menos de dez minutos, três parentes caíram na armadilha. Juntos, perderam R$ 462,51 no golpe. 
“Foi uma coisa muito chata. Fiquei muito mal por isso, me sentindo  culpada, mas não tinha como eu saber. O golpe estava muito perfeito. Quando vi a cilada avisei que era golpe, mas aí já era tarde”
– Patricia Soares, vítima de golpe de falso concurso do Ministério da Saúde.
Provavelmente, eles não foram os únicos que tiveram prejuízo com o esquema de fraude. Ao menos 513 anúncios promovendo esse mesmo golpe estavam ativos na Meta — empresa dona no Facebook, Instagram e WhatsApp —, até a manhã desta segunda-feira (26), conforme levantamento da Lupa na Biblioteca de Anúncios da Meta
A página “Direito Brasileiro”, responsável pelo anúncio que impactou Patrícia — e levou que ela e sua família caíssem no golpe — tinha 200 anúncios ativos no Facebook, Instagram, Threads e Messenger, até a mesma data. O perfil foi criado em 11 de janeiro de 2025, não tem nenhuma publicação e somente dois seguidores, o que indica se tratar de uma conta criada para aplicação de golpes. 
Perfil usado por criminosos publicou ao menos 200 anúncios na Meta promovendo golpe do falso concurso. Imagem: Reprodução.

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Como o golpe funciona

Após clicar no anúncio, as vítimas são direcionadas a um site onde a fraude se concretiza. A Lupa teve acesso à página que enganou Patricia. Ela imita o site oficial do governo: exibe o logotipo do Ministério da Saúde, reproduz a identidade visual do portal gov.br e apresenta textos institucionais semelhantes aos de programas reais.
Os campos de cadastro reforçam a ilusão de legitimidade — ao digitar o CPF, o sistema preenchia automaticamente informações pessoais como nome completo, nome da mãe e data de nascimento. Apurações da Lupa mostram que essa é uma prática comum entre os golpistas, e que dados pessoais da população são comercializados na internet e usados para diferentes crimes há mais de 10 anos.   
O link me levou direto para uma página que parecia do governo federal. Solicitou meu CPF, preenchi e fui redirecionada para a [réplica da] página ‘gov.br’. Apareceu lá o nome da minha mãe, minha data de nascimento, o endereço, tudo automático. Foi aí que eu não desconfiei mesmo”
– Patricia Soares, vítima de golpe de falso concurso do Ministério da Saúde.

Site imita elementos de páginas do governo federal e Ministério da Saúde para aplicar golpe. Imagem: Reprodução

O site também solicitou o CEP de Patrícia. Segundo a vítima, o sistema indicou uma escola estadual próxima de sua residência como local de treinamento, o que contribuiu ainda mais para a credibilidade do esquema. “Apareceu uma escola aqui perto de casa. Mais um motivo para achar que era real”, relatou.
Foi só na etapa final que o golpe ficou evidente: “Quando chegou na conclusão da inscrição, apareceu a opção ‘pagamento por Pix’. Foi aí que a ficha caiu. Pensei: ‘Não existe processo seletivo do governo que cobre [somente] via Pix’ ”, disse.
Na página, os golpistas também exploram o senso de urgência para pressionar decisões rápidas. Um botão azul vibrante convida o visitante a clicar em “Inscrições”, reforçado por um alerta em vermelho, com letras maiúsculas: “INSCREVA-SE AGORA! VAGAS LIMITADAS”.
Golpistas reforçavam o senso de urgência nas vítimas alegando haver vagas limitadas no falso concurso. Imagem: reprodução.
A mensagem surtiu efeito, como relatou à Lupa a dona de casa Alessandra Mayra Soares, sobrinha de Patrícia e uma das vítimas do esquema.
Minha tia me mandou o link. Aí ela falou: ‘se inscreve rápido porque tem poucas vagas’. Parecia uma boa oportunidade. Corri para me inscrever. A tia Patrícia, sempre que vê uma oportunidade na internet, dessas coisas do governo, ela compartilha com a família. Não tinha porque desconfiar”
– Alessandra Mayra Soares, vítima de esquema promovendo falso concurso de agente de saúde do Ministério da Saúde.
Segundo ela, o site parecia legítimo: redirecionava para uma réplica do portal do governo, onde era possível, inclusive, escolher o posto de saúde mais próximo, selecionar uma escola para fazer a prova e pagar a suposta taxa de inscrição. “Cadastrei tudo bonitinho. Tinha uma taxa de inscrição e outra para agendar um segundo teste — tipo o exame psicotécnico do Detran [necessário para tirar a carteira de motorista]. Fiz o pagamento”, relatou.
Após saber que tinha caído em um golpe, Alessandra conta que entrou em contato com o banco para tentar reaver os valores enviados via Pix aos golpistas: R$ 87,40, referentes à suposta inscrição, e R$ 138,46, cobrados como taxa de uma prova psicotécnica. O pedido de estorno está em análise pela instituição financeira.
O que mais chocou Patrícia foi ter se tornado, ainda que involuntariamente, peça chave na propagação da fraude.
 “O mais absurdo é que, além de o golpista divulgar nas redes sociais, as próprias vítimas acabam ajudando a espalhar o golpe. Eu fui vítima, compartilhei e, sem querer, ajudei os golpistas. Olha que loucura.”
– Patrícia Soares, vítima de golpe de falso concurso do Ministério da Saúde.

Programa Mais Saúde com Agente

O Ministério da Saúde, em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde, lançou o programa Mais Saúde com Agente, voltado para a capacitação técnica de Agentes Comunitários de Saúde (ACS) e Agentes de Combate às Endemias (ACE) de todo o país.
A iniciativa tem como meta qualificar mais de 300 mil profissionais até 2026. A formação é gratuita e oferecida no formato semipresencial: os conteúdos teóricos são realizados a distância, por meio de uma plataforma virtual, e as atividades práticas ocorrem nos próprios territórios de atuação dos agentes.
Para participar, é necessário que o agente atue em um município que tenha aderido ao programa, tenha concluído o ensino médio — ou esteja cursando o último ano, ou a modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA) — e possua conta ativa no gov.br.
As inscrições devem ser feitas exclusivamente pelo site da iniciativa: www.gov.br/saude/pt-br/composicao/sgtes/mais-saude-com-agente.  

AGU entrou com ação contra a Meta por golpes

Não é de hoje que criminosos utilizam as plataformas da Meta para aplicar golpes do gênero. Em abril deste ano, a Advocacia-Geral da União (AGU) entrou com uma ação civil pública contra a empresa para tentar frear a veiculação de anúncios falsos que usam símbolos do governo federal e imagens manipuladas para enganar consumidores.
Segundo a AGU, foram identificados ao menos 1.770 anúncios fraudulentos com esse tipo de conteúdo, veiculados nas plataformas da Meta. O órgão argumenta que o sistema de verificação de anúncios da Big Tech é falho e descumpre até mesmo os próprios termos de uso da empresa. Por isso, solicitou que a plataforma seja condenada por danos morais coletivos, por violar normas legais de proteção ao consumidor contra publicidade enganosa.  Caso a Justiça acate o pedido, o valor da indenização será destinado ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos.
Nesta segunda-feira (26), a AGU requisitou ao Supremo Tribunal Federal (STF) a aplicação imediata de medidas judiciais para cessar episódios de desinformação, casos de violência digital e danos provocados pela omissão de redes sociais em evitar a divulgação de conteúdo ilícito em suas plataformas digitais.
Em nota à Lupa, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom) afirmou que “as divulgações sobre ações do Executivo Federal são realizadas nos canais do próprio governo”. A pasta reforçou que o portal GOV.BR reúne informações sobre políticas públicas e serviços oficiais, e destacou que a primeira tela do site já questiona o cidadão: “O que você procura?”. Segundo o governo, “quando o site não mostra resultados para uma política, então ela muito provavelmente não existe”.
A Secom também lamentou “a divulgação de conteúdo falso para aplicação de golpes" e indicou que há orientações disponíveis sobre como denunciar esse tipo de crime, acessíveis na página do governo

O que diz a Meta

Em nota à Lupa, a Meta informou: "Atividades que tenham como objetivo enganar, fraudar ou explorar terceiros não são permitidas em nossas plataformas e estamos sempre aprimorando a nossa tecnologia para combater atividades suspeitas. Também recomendamos que as pessoas denunciem quaisquer conteúdos que acreditem ir contra os Padrões da Comunidade do Facebook, das Diretrizes da Comunidade do Instagram e os Padrões de Publicidade da Meta através dos próprios aplicativos”. 
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