Voto eletrônico ou impresso? Entenda a auditoria nas urnas na Venezuela, Colômbia e EUA

Jornalismo

Eleições

25.07.2024 - 13h06

Ítalo Rômany

João Pessoa - PB

Nicolás Maduro. Foto: Governo da Venezuela

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, criticou sistemas eleitorais de diversos países durante comício na noite de terça-feira (23), no estado de Aragua. Em seu discurso, Maduro afirmou, sem provas, que as eleições no Brasil, nos Estados Unidos e na Colômbia não eram auditadas.

"São três da manhã, mas antes temos que esclarecer à extrema direita que respeitem o processo eleitoral, que nós vamos ganhar outra vez e que na Venezuela vai haver democracia, liberdade e paz. Temos o melhor sistema eleitoral do mundo. Tem 16 auditorias. Eles fazem uma auditoria, como vocês sabem, em 54% das mesas. Em que outra parte do mundo se faz isso? Nos Estados Unidos? É inauditável o sistema eleitoral. No Brasil? Não auditam nenhum registro. Na Colômbia, não auditam nenhum registro. Na Venezuela, auditamos no momento, na mesa", disse Maduro.

No domingo (28), eleitores da Venezuela irão eleger o novo presidente do país. Em um comício anterior, em Caracas, Maduro disse que poderia haver 'banho de sangue' e 'guerra civil' caso ele não vencesse o pleito.

A Lupa conferiu como funciona o processo de auditoria em cada um dos países citados por Maduro, além da própria Venezuela. Confira:

Venezuela

Máquinas de votação na Venezuela. Foto: CNE/Venezuela

O sistema de votação na Venezuela é eletrônico. Segundo o Regulamento Geral da Lei Orgânica de Processos Eleitorais, de 2013, o eleitor dirige-se à urna, pressiona os botões referentes ao candidato, e clica, em seguida, no botão ‘Votar”. “O voto ficará depositado eletronicamente nas unidades de armazenamento do sistema automatizado de votação”, diz a legislação. Logo em seguida, um comprovante do voto é impresso. “Pressionado o botão ‘VOTAR’ na tela, a máquina de votação imprimirá um comprovante de voto, no qual deverá ser obrigatoriamente depositado pelo eleitor na urna, para realizar a Verificação Cidadã”.

O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela detalha em seu site 14 etapas de auditoria. Após o encerramento da votação, uma verificação é realizada em parte das urnas usadas na votação para conferir os votos registrados e apurados na urna eletrônica e os recibos de voto contidos na caixa de recibo. O CNE sorteia aleatoriamente as máquinas que passarão por essa auditoria após o encerramento do horário de votação. A legislação afirma que, como amostra, 54% das máquinas devem passar por essa auditoria (página 4). "A auditoria de encerramento é um evento público sem outras limitações além das derivadas da capacidade física das instalações e da segurança do evento eleitoral. Testemunhas de organizações com fins políticos testemunham e assinam o certificado de auditoria", diz o texto do CNE.

Colômbia

Na Colômbia, o voto é realizado por meio de um cartão eleitoral, onde o eleitor assinala a sua preferência escolhendo um candidato, partido ou movimento político específico, ou marcando em branco a opção de voto. Em maio de 2023, o Senado aprovou uma medida que incorpora o modelo eletrônico misto ao sistema de votação (que funcionará tanto por papel quanto por voto eletrônico), com previsão de implementação após as eleições de 2026.

Além das auditorias realizadas por partidos políticos, missões internacionais monitoram os testes de funcionalidade do sistema eleitoral. Na semana anterior ao dia do pleito, os auditores de campanha são responsáveis pela revisão do software do processo de contagem dos votos e do código-fonte. No dia da eleição, eles supervisionam a pré-contagem e todos os centros de processamento, e auditam o funcionamento do software usado na contagem dos votos.

Segundo o Conselho Nacional Eleitoral da Colômbia, existem duas etapas de contagem e validação de votos, conhecidos como 'preconteo' e 'escrutinio'.

Na etapa de pré-contagem, após o encerramento da votação, cidadãos cadastrados como testemunhas eleitorais podem participar do processo de auditoria (páginas 74-76), verificando as etapas de contagem de votos. Os responsáveis por cada seção contabilizam os votos emitidos e registram em cada lista a votação do candidato ou partido nos formulários do sistema. "Para garantir a transparência e publicidade da votação, as testemunhas eleitorais designadas pelas juntas ou movimentos políticos que tenham inscritos candidatos terão o direito de apresentar reclamações".

Os boletins de pré-contagem, divulgados pelo Registo Nacional do Estado Civil da Colômbia, são entregues no próprio dia das eleições. Essas informações são consolidadas nos centros de processamento e posteriormente divulgadas. Na etapa de 'escrutinio', juízes validam os formulários assinados pelos júris votantes com a totalização da contagem dos votos. De acordo com o disposto no Código Eleitoral, os resultados oficiais das eleições só são conhecidos após a conclusão do processo de apuração, realizado pelas comissões de apuração e pelo Conselho Nacional Eleitoral.

Além disso, existe um processo de digitalização dos formulários eleitorais com a contagem de votos de cada seção, disponibilizados no site oficial. Qualquer cidadão pode consultar essas informações.

Exemplo de formulário com contagem de votos disponibilizado publicamente.

O Registro Nacional do Estado Civil da Colômbia informa em seu site que 988 observadores internacionais estiveram presentes durante os processos eleitorais de 2022 na Colômbia.

Estados Unidos

Nos Estados Unidos, os eleitores escolhem seus candidatos marcando uma cédula de papel, manualmente ou por meio do uso de um dispositivo auxiliar de marcação de cédulas (BMD), ou em sistemas eletrônicos de gravação direta (DRE), que registram os votos diretamente na memória do computador. O sistema depende de cada estado.

O sistema de auditoria também depende de cada estado e de cada legislação local (página 4). Nas eleições de 2020, 44 estados tiveram algum tipo de auditoria de tabulação pós-eleitoral para verificar se o equipamento de votação usado contou corretamente os votos. Alguns estados como Arkansas e Michigan, por exemplo, exigem uma auditoria dos procedimentos eleitorais. Mesmo quando não exigido por lei, alguns estados como Missouri e Nebraska realizaram auditoria por meio de uma regra ou orientação administrativa formal.

A contagem de votos, por exemplo, pode ser feita manualmente. Os registros em papel podem ser preservados para serem tabulados em caso de auditoria ou recontagem. Em alguns estados, a legislação determina a recontagem de votos automaticamente, caso a vitória de um candidato fique dentro de uma certa margem.

Nas eleições presidenciais de 2020, Donald Trump contestou os resultados na Geórgia e alegou, sem provas, que havia irregularidades. As autoridades eleitorais na Geórgia puderam contar manualmente os votos e confirmar que Joe Biden havia realmente vencido no estado.

Um comunicado divulgado por autoridades eleitorais federais e estaduais americanas após a vitória de Joe Biden em 2020 defendeu que as eleições daquele ano foram “as mais seguras da história americana” e que não havia evidências de votos perdidos, deletados, trocados ou comprometidos.

Empresas de equipamentos de votação como Dominion Voting Systems (DRE) e Smartmatic processaram aliados de Trump por falsas alegações de fraude eleitoral em 2020, incluindo a de que as máquinas transferiram votos de Trump para Biden.

Brasil

Teste público de segurança das urnas. Foto: Alejandro Zambrana/Secom/TSE

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) explica em seu site que as eleições no Brasil passam por diversas fases de auditoria interna e externa. Um desses instrumentos é o Boletim de Urna (BU), que é impresso nas seções eleitorais ao encerramento da votação.

O BU é um comprovante que traz o total de votos por partido, o total de votos por candidato, o total de votos em branco, o total de comparecimento, e o total de votos nulos. Além disso, inclui dados como identificação da seção e zona eleitoral, a hora do encerramento da eleição, o código interno da urna eletrônica e a sequência de caracteres para validação do boletim.

Após o encerramento da votação, a urna imprime o BU em cinco vias. Uma das vias impressas é afixada imediatamente no local de votação, visível a todos, para que o resultado da urna se torne público. Nas eleições de 2022, o Tribunal de Contas da União (TCU) selecionou aleatoriamente 4.161 urnas eletrônicas em operação no dia da votação para comparar a informação do boletim impresso com a informação disponibilizada pelo TSE. Não houve qualquer divergência nos dados.

Além disso, o código-fonte da urna é mantido sob um sistema de controle de versões de software, com acesso restrito e com registro de todas as modificações. Esse controle permite que, na cerimônia de lacração, os fiscais possam analisar se houve alguma mudança ou manipulação, sendo possível identificar o que foi modificado e quem realizou esse serviço.

Em toda votação é promovido o Teste de Integridade, simulação na qual votos em cédulas de papel são manualmente inseridos em urnas, sorteadas na véspera da data do pleito. Todo o procedimento é transmitido ao vivo pela internet e acompanhado por empresas de auditoria externa. Ao final do teste, é possível comparar se o resultado das cédulas do papel equivale ao consolidado pelo dispositivo de votação e, assim, validar a integridade das urnas eletrônicas.

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